terça-feira, 3 de novembro de 2009

Um dia morremos e põe-nos a vida toda na rua. Assim.



 Se, depois de eu morrer...

Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,

Não há nada mais simples.

Tem só duas datas --- a da minha nascença e a da minha morte.

Entre uma e outra todos os dias são meus.



Sou fácil de definir.

Vi como um danado.

Amei as coisas sem setimentalidade nenhuma.

Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.

Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.

Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras;

Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.

Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.

Fechei os olhos e dormi.

Além disso fui o único poeta da Natureza.

Alberto Caeiro

2 comentários:

Luisa disse...

Zoe,

O poema é lindo!

A nossa vida fica exposta com objectos que estimámos, e que os outros os pontapeiam!

Abraço
Luisa

Zoe disse...

luísa
faz-me muita, muita impressão quando as pessoas morrem, os herdeiros, sejam eles quem forem, deitarem os objectos pessoais na via pública. algumas vezes, lá pelo meio vamos encontrar um cão ou um gato...
abraço