segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Adeus Novembro

Faltam poucas horas para ele acabar. Tanks God, ele e mais a sua maldição, o seu cheiro a sangue,  as horas indefiníveis, a falta de paciência das pessoas que não sabem o que vestir porque ainda não guardaram a roupa de Verão e ainda não tiraram a de Inverno cá para fora, mas uns já tiraram e andam a cheirar a mofo e a naftalina, como elas próprias, e eu não o suporto, porque é Novembro. Aquele que tem o som do domingo de manhã todos os dias do mês e os todos pólenes para eu respirar e asfixiar porque todos os dias são de finados e tudo o que acontece está amaldiçoado, poluído, viscoso, húmido. Esqueci-me de deixar a contagem da água na porta. A lâmpada do dressing room fundiu-se e eu agora apalpo o que não vestir, os collãs torcem-se nas pernas, e os pés engordaram desde o ano passado e não querem entrar nas botas. Nem eles, nem eu. Há também o cheiro a graxa, a chuva, mas não está frio, porque tudo é dúbio, indefinido, glauco: o céu, as pessoas, o patrão do café, o ar que respiramos, o sapateiro que ainda não tem a tinta ouro-velho. Quanto mais escrevo, menos tempo falta. Só uma hora. Até o carteiro se enganou e colocou duas cartas para a minha vizinha do 2º direito na minha caixa do correio, não sei porque não fiz um buraco e enfiei o indicador por ali adiante que é como costumo fazer para abrir cartas, à bruta, senão lá ia eu com as cartas em fanicos, estavam na minha caixa do correio, abri sem querer, agora eu não vou lá bater a casa dela porque já estou de pijama que é de porquinhos grotescos que até têm bonés na cabeça. Não me apetece fazer sopa, nem comê-la. Aliás, não me apetece fazer nada. Mas, porque é que tem de nos apetecer fazer alguma coisa? Não podemos não fazer? É sempre obrigatório, imperioso, imprescendível fazer? Os gatos andam mais inquietos e derrubam tudo à sua passagem, os recipientes de granulado, a água, o tapete pendurado na parede do corredor, a cadela ladra mais e está com faringite, o Farrusco faz urinas territoriais à porta do prédio e andamos à procura da Flor debaixo dos carros para lhe dar a pílula. Porque é Novembro, as iluminações de Natal já estão por todo o lado e já temos de ser bonzinhos, mas ainda não está frio para sermos mesmo bonzinhos, no entanto, já começam a montar as tendas para os circos para as festas de Natal, que feliz deve estar o Menino Jesus ao saber que se comemora o seu nascimento com espectáculos de crueldade contra animais. A cabeleireira, ou melhor, a menina-que-lava-cabeças comprou um casaco de pele de coelho em 2ª ou 3ª mão, em dez prestações, e está desejosa de o estrear, porque pensa que é fino e que ela vai ficar mais fina, pobrezinha. De braço dado com o seu bate-chapas, a passear no centro comercial, ao domingo. A minha arruda secou e a minha gata comeu pétalas de um girassol na jarra, a máquina de lavar chia mais na centrifugação e uma toalha caiu-me no estendal da vizinha de baixo, o barulho do motor do frigorífico é ensurdecedor, porque é Novembro o mês de todas as cores do sangue: o escarlate, o encarnado, o rubro, o carmim, e de todo o cheiro das crisântemos. Falta pouco, muito pouco, escrever é bom, amanhã, mesmo se estiver a chover, o dia nascerá claro e limpo e eu vou pintar o cabelo, as sobrancelhas e as pestanas e tudo o que me passar pelas mãos, porque se acabou a maldição do mês de Novembro.

8 comentários:

A lupa de alguém disse...

Olá. Nunca tinha visto alguém a não gostar do mês de Novembro. Nem tudo de ruim acontece em Novembro, mas pareces não ter gostado mesmo deste mês. Espero que Dezembro te traga mais alegrias! :)

Mary disse...

A Zoe
está armada em protestante.
Contesta tudo e todos e agora até o coitado do mês de Novembro é alvo da sua contestação.

Ele não é só o mês dos finados e do anúncio do Inverno, mas tb é a época do Verão de S. Martinho e das castanhas quentes e boas.

Zoe disse...

Olá Lupa
sou uma pessoa depressiva por natureza, e o mês de Novembro deprime-me mais do que qualquer um, não foi este em particular, todos os que lhe hão-de seguir também n serão mais alegres.
beijinho
zoe

Zoe disse...

Mary,
o mês de Novembro n foi alvo da minha contestação, deprime-me mais do que qualquer outro. um daqueles estudos __que ninguém sabe como foi feito, nem a quem__, revelou que o mês de Novembro é o que regista a mais elevada taxa de suicídios, portanto parece que n sou a única a sentir o spleen do mês de novembro...

WOLKENGEDANKEN disse...

Naturalmente o estado de animo que te levou a escrever este texto nao tem nada de bonito (Bom, tambem pode-se saborear a melancolia, mas acho que isso so é possivel quando em realidade o estado de animo esta equilibrado)Mas o texto esta muito bem escrito e interessante para ler.E espero que dicembro seja melhor para ti . Embora a taxa de suicidio no Natal tambem nao é uma delicia :(

Zoe disse...

viva wolken!
obrigada pela crítica literária.
quanto à taxa de suicídio na época do Natal, é verdade que ela é muito elevada, mas parece que o mês de Novembro ultrapassa! se calhar, há uma antecipação, esta época é uma verdadeira hipocrisia.
beijinhos
zoe

Carlota e a Turmalina disse...

Isso eu não sabia...aqui o mês de novembro é gente e acho que poucas pessoas cometem suicidio no calor. Sei lá...não sou muito versada nesse assunto.Mas o que imposta é que já é Dezembro e logo mais estaremos em Janeiro :o)
Porque eu não gosto mesmo muito é de Dezembro..rss...

Zoe disse...

então turmalina não gosta de dezembro por causa da hipocrisia à volta do Natal?